Há algum tempo tive
o prazer de conhecer o Maison Nerudiano
em Santiago do Chile, um restaurante com espaço subterrâneo para declamação de
poesias do Pablo Neruda e shows de Jazz.
Quando estava
naquela ampla sala inferior, lembrei-me claramente que desde menino gostava de
me esconder embaixo da cama, onde ficava por horas a fio, calado, sem precisar
conversar com ninguém.
Ali, sozinho,
debaixo da cama, estava o meu microcosmo infantil, um universo particular, um
submundo próprio criado pela imaginação fantasiosa daquela idade.
Dessa mesma época,
relembro do desejo de ter um espaço no subsolo que fosse só meu, uma espécie de
porão secreto, onde pudesse permanecer alheio a tudo e, ao mesmo tempo,
protegido do mundo exterior.
Essa ideia de
proteção não ocorre por acaso, afinal, existirá lugar mais protegido do que sob
a terra? Os bunkers mais seguros são
construídos no subsolo, inclusive para fins de prevenção a ataques nucleares.
Alguns poderiam
adjetivar essa preferência infernal (subterrânea) como sombria ou melancólica,
porém, o sabor psicológico desse tipo de lembrança vai muito além disso.
O anseio de proximidade
com o subterrâneo é muito mais uma vontade de introspecção, de busca por si
mesmo e de depuração da alma.
Aliás, desde a Idade
Média os Alquimistas proclamavam visita
interiora terrae, retificandoque invenies occultum lapidem, como meio de busca do homem superior (Pedra Filosofal)
e da sociedade aperfeiçoada.
Portanto, símbolos
como a caverna, o porão, o subsolo, Jonas no ventre da baleia e o crânio vazio,
são metáforas do autorrecolhimento que podem funcionar como um lenitivo para a
alma e um meio de recuperação e superação das asperezas e dificuldades do mundo
real.
No subsolo as
imagens se confundem, as pessoas se encontram, as emoções parecem arcaicas, o
silêncio é o único amigo e o gosto final é sempre doce.