Numa época, meados do século 19, em que máquinas fotográficas eram
um trambolho e, ao mesmo tempo, um luxo, quem retratava a natureza eram os
artistas viajantes, com seus lápis e pincéis. Por sorte, ainda havia muita
natureza a retratar, principalmente no Brasil, embora, entre uma viagem e outra,
os europeus que nos visitavam já percebessem o começo da devastação.
Um desses artistas só está sendo revelado agora: a inglesa
Marianne North (1830-1890). Sua viagem ao Brasil, em 1872-73, lhe rendeu 112
pinturas a óleo sobre papel da nossa paisagem e flora -o que supera em número a
obra de Thomas Ender, Rugendas e Debret no gênero, além de antecipar em cem anos
a de outra inglesa, a querida Margaret Mee (1909-1988). A íntegra de sua
produção brasileira está no livro "A Viagem ao Brasil de Marianne North", com
texto de Julio Bandeira, recém-lançado pela Sextante.
Marianne veio ao Brasil sozinha, o que não foi pouca façanha, e,
pelo que pintou e escreveu, nunca se arrependeu. Era fascinada pelas árvores,
plantas, flores, frutas, borboletas e cobras com que deparava, e deixou um
exuberante registro pictórico de tudo isso -com o qual, em Londres, matava seus
conterrâneos de inveja.
Segundo Bandeira, o único desgosto de Marianne era constatar, a
cada passo, a aversão dos brasileiros à floresta, vista como um lugar ameaçador,
"um pesadelo a ser destruído". O que a mata virgem provocava na gente da terra
era "o nojo, um terror iluminado apenas pelo clarão ardente das queimadas". E
não se conformava com a total ausência de naturalistas brasileiros -como se a
riqueza natural não fosse digna de estudo.
Quase 150 anos depois, se Marianne voltasse aqui, não lhe
faltariam brasileiros com quem discutir a mata. Entre esses, os defensores de
códigos florestais movidos a motosserras.
A crônica foi publicada no Jornal Folha de S. Paulo, mas eu li no www.irbianchi.com
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