3 de maio de 2008

O BERIMBAU DO DOUTOR (ELIANE CANTANHÊDE)

Mesmo com o "investment grade" do Brasil, o "boom" de ontem das Bolsas e o Dia do Trabalho hoje, não dá para deixar passar em branco a declaração do Dr. Antônio Dantas, coordenador do curso de medicina da Universidade Federal da Bahia, ontem na Folha, sobre o baixo desempenho da sua instituição no Enade.

"O baiano toca berimbau porque só tem uma corda. Se tivesse mais, não conseguiria", disse, atribuindo o vexame ao que seria doença hereditária: o "baixo QI dos baianos".

Não se sabe o que é pior: o MEC ter de punir 17 (17!) cursos de medicina por serem uma porcaria, incluindo aí os de quatro universidades federais, ou ter de agüentar o coordenador do curso de uma delas falando uma barbaridade dessas. Com um coordenador assim, e com professores desse calibre, o que você poderia esperar dos cursos e dos alunos?!

Aliás, pobres alunos! Pior: pobres pacientes! Já era grave o MEC ter de intervir diretamente para socorrer alunos de pedagogia e direito que ficaram abaixo da crítica pelo país afora. E ficou insuportável saber que na medicina não é muito melhor. Tudo é uma questão de vida ou morte. Maus advogados podem virar uma praga e pedagogos ignorantes podem ser fatais na vida de seus estudantes, mas um mau médico carrega um risco de morte bem mais iminente.

Um diagnóstico errado, uma operação malfeita, um remédio inadequado podem decidir o destino de uma pessoa. E, assim, de famílias inteiras. Parabéns ao Brasil pelo "investment grade", que vai atrair milhões de dólares produtivos, e parabéns aos trabalhadores pelo seu dia. Meus pêsames às faculdades que convivem com os "doutores dantas", seus preconceitos, sua ignorância, suas brincadeiras absurdas (ou será que não foi brincadeira?).

O problema não é o berimbau dos alunos; é a falta de berimbau de certos professores.

PS - Sim, ele é baiano.

Comentário: Excelente artigo. Por mais que deva ser assegurado o direito a livre manifestação, os preconceitos e generalizações devem ser rechaçados, pois geram contra-cultura perigosa para a desejável coesão social.

Exemplo clássico de que título acadêmico, por si só, não "ilumina" ninguém.

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